domingo, 29 de julho de 2018

A morte



A não ser que estejamos falando sobre respirar e chorar, ninguém nasce sabendo das coisas. Tudo se aprende, ainda mais quando diz respeito à morte. Assim como tudo na vida, só se aprende a lidar com ela quando demos de cara com essa coisa. Quando morre nossa primeira pessoa querida ficamos sem chão, mas na medida em que isso se repete vamos aprendendo a ver com naturalidade. Morrem avós, amigos, pais e vários bichos de estimação e passamos a ver -por mais redundante que possa parecer- essa coisa natural que é a morte com naturalidade. Algumas pessoas se vão e outras chegam em nossas vidas, esse é o ciclo. Todos passam por isso.
Mas tem uma coisa que nem todos passam e que confesso não desejar a ninguém. Uma morte que não é natural como as descritas acima, a morte de nosso time de coração. A morte que falo não é a simples eliminação de um mata-mata, tampouco é a doloroso rebaixamento para um divisão inferior. A morte do time é seu simples desaparecimento, bem como dos entes queridos, amigos e peixinhos dourados que se vão na privada. Aquele que um dia existiu permanecerá a partir de então apenas nas lembranças. Essa é a sensação que a Portuguesa deixa a todos seus torcedores ao ficar sem jogar nenhum campeonato nacional nesse ano. Nada de série A, B, C, D ou Copa do Brasil. O clube ainda não morreu de fato, mas está em coma, próximo do fim. Sua morte deixará uma multidão de órfãos de uma só vez, das mais diversas idades, desde os de dentadura até os com dentes de leite.
O luto de um time de futebol não dura uma semana, um mês ou um ano, durará a vida toda. Esse luto persistirá, vindo a tona nos momentos mais corriqueiros, como ao ver torcedores de outros times reclamarem de suas campanhas, de suas escalações, contratações, etc., ao vermos que nós não temos mais time para reclamar dele. As vezes, ao sentir saudades de alguém, buscamos observar fotos dessas pessoas, momentos bons que passamos juntos, e com o clube não será diferente É só trocar os álbuns familiares pelos álbuns de campeonatos brasileiros.
Chegamos até ao delírio de imaginar que se todos aqueles que hoje ainda estão em atividade tivessem permanecido no clube, poderíamos ter tomado outro rumo. O que teria acontecido se a Lusa ainda tivesse Bruno Henrique, Moisés, Weverton, Henrique Dourado, Ricardo Oliveira, e se chamássemos de volta Zé Roberto, Rodrigo Fabri e Capitão? Certeza que eles topariam! Por que não?
Voltamos do devaneio e nos deparemos com o luto. O luto que transformará o verde e vermelho em preto. Essa morte não terá velório, será apenas o enterro. Enterro esse que se dará com a venda do Canindé para os abutres da especulação imobiliária.
Ver a capa da Veja com parte do Canindé sendo demolido faz lembrar os inúmeros bolinhos de bacalhau ali devorados, das crianças após o jogo chutando latinhas de refrigerante imitando o jogo que haviam visto um pouco antes, ver o Sardinha e a Rainha da Leões xingando tudo e todos, os inúmeros jogos vistos da tradicional escanteio debruçado nas grades... os cartolas lusitanos estão de parabéns, conseguiram destruir isso em pouquíssimo tempo.
O futebol perde com o fim da Portuguesa, mas o futebol não tem ossos, músculos e nervos. O futebol não sente raiva, angústia e nem dor. Nós torcedores sim. Seremos os primeiros apaixonados por futebol que não temos mais um clube para torcer. Os órfãos do futebol.
A Portuguesa ainda não morreu, mas está em estado vegetativo, respirando por aparelhos. Quando me perguntarem pra que time torço não saberei o que responder. Talvez tenha que responder igual as crianças que não gostam de futebol, "torço pro Brasil".
Muitos perderão pessoas queridas, mas poucos saberão o que é perder o time de futebol. Não desejo isso pra ninguém, nem pro arrombado do Castrilli.

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