quinta-feira, 16 de julho de 2015

O diploma é uma conquista pra quem?

      José é filho de um operário da construção civil e de uma empregada doméstica. Sempre estudou em escola pública. Na adolescência entregava panfletos no farol, panfletos de propaganda de luxuosos prédios que apenas ouvira falar, pois sua mãe trabalhava em um. Morava em um bairro pobre de São Paulo, na zona leste. Já adulto, trabalhou com o pai na construção civil e a noite fazia bicos como segurança em uma casa noturna. Em uma conversa com os pais, cogitou a possibilidade de fazer uma faculdade. Quando contou aos amigos que voltaria a estudar deram risada. “Isso não leva ninguém a nada”, ele ouviu. Começou a estudar em um cursinho popular perto de sua casa. Prestou vestibular, e passou.

      Pedro morava em Moema. Filho de um diretor de uma construtora e de uma empresária, ambos com ensino superior. Sempre estudou em escolas particulares e sempre teve acesso a planos de saúde. Quando não estava na escola estava na natação, nas aulas de violão ou na escolinha de futebol. Ao ter problemas na escola, foi levado ao psicólogo. Ao chegar em casa, sempre havia mesa farta, preparada pela empregada. Quando terminou a escola, morou na Inglaterra para estudar a língua e conhecer outra cultura. Ao voltar, prestou vestibular, e passou.

      Durante toda a graduação José teve que conciliar o trabalho noturno com os estudos. Morava na moradia da faculdade, onde residiam os alunos pobres que passavam pela catraca que é o vestibular. Por várias vezes não tinha dinheiro para visitar os pais, recebia uma mísera bolsa de estudos que mal dava para se alimentar. Na faculdade imaginou que não sofreria do racismo que o acompanhava por toda a vida. Mal sabia que no seu primeiro ano de faculdade, enquanto estudava para a prova de anatomia que teria no dia seguinte, seria preso pelos guardas do campus na sala de informática com o argumento de estar depredando o ambiente. Participando do movimento estudantil viu que os problemas que o afligiam não eram apenas seu.

      Ao passar no vestibular, Pedro comemorou como se não houvesse amanhã. Recebeu parabéns de todos que souberam de seu êxito. Durante a graduação não precisou trabalhar, seus pais depositavam toda semana uma mesada em sua conta bancária que proporcionava que comesse bem, frequentasse festas, viajasse, etc. No segundo ano de faculdade, fez intercâmbio para a Austrália pelo programa ‘ciências sem fronteiras’. Quando voltou, interessou-se pelo movimento estudantil. Depois de um tempo não reconhecia-se mais como antes, descobriu-se privilegiado.

      José foi o primeiro de sua família a ter curso superior, comemorou seu diploma como Davi comemorou a vitória contra Golias. Na colação de grau, ao pegar o canudo das mãos dos diretores, recusou-se a cumprimenta-los. Foi sindicado pelos burocratas 7 vezes, por lutar pelos estudantes pobres na universidade.

      Pedro foi a colação de grau apenas para prestigiar seu amigo José. Não participou da cerimônia pois sabia que para ele se formar não foi nenhuma conquista, não fez mais que sua obrigação.

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