terça-feira, 30 de outubro de 2012

Ao(s) vivo(s) em Salvador

   Quem conhece Salvador? Quem conhece Salvador conhece o Pelourinho? Sabem de seu passado histórico? Sabem o que mais chama atenção por aqui? Algumas pessoas, homens, mulheres e garotos, em vielas e praças. Sabem porque eles chamam a atenção? Pela inconveniência. São inconvenientes. São inconvenientes pois enxem a nós, turistas, o tempo inteiro pedindo cigarros, moedas ou nos fornecendo prestatividade em troca de dinheiro.
   Quando conseguem seu objetivo somem em segundos e se você estiver entre as vielas é possível ve-los tragando algo, algo que não é identificável de longe, algo que os deixam como mortos-vivos, zumbis de cinema, vagando com expressões estranhas, olhar sem concentração alguma mirando algo perdido ao chão. Não parecem pessoas, parecem zumbis, não o de Palmares, os de cinema, com o corpo muito similar ao de pessoas normais, mas com outro comportamento.
   A culpa é de quem? É minha? É nossa? É deles? É da criança que temos pena de ver como nóia (saci por aqui) e mais tarde quando for um nóia crescido batemos palma pra polícia que bateu, prendeu e matou esse vagabundo que não respeita as leis? Não é uma violência o que acontece com essas pessoas? Quem combate essa violência? De quem é a culpa?
   O que me incomoda não é eles existirem, é eu ver eles existirem. Eu não ligo pra eles. Eu não ligo pro crack. Eu não ligo porque sei que ele não foi feito pra mim. Mas como e pra quem ele foi feito?

 
 
 

domingo, 21 de outubro de 2012

"a multidão é um monstro sem rosto e coração"





    "Atirador mata 14 pessoas na Estreia de Batman nos EUA", "atirador entra em escola em Realengo, mata alunos e se suicida", "aluno mata colega e fere outros quatro nos Estados Unidos". Esses são alguns dos casos que jornalistas como Datena e Gil Gomes diriam que foram cometidos por pessoas desumanas, por monstros. Gostaria de saber desses emotivos jornalistas o que os capacita para se referirem a uma pessoa com tal ofensa. Será a capacidade de julgar quem é ou não humano uma dádiva divina? Ou será a explicitação da crueldade do crime que o caracteriza como monstros?
    Um "cidadão de bem" que mantém sua família com os lucros de sua empresa pagando um salário mínimo aos seus empregados, é mesmo um cidadão de bem, mesmo todos nós sabendo que com R$690,00 não se vive no estado de São Paulo? Trabalhadores que trabalham em linha de produção, de qualquer produto, se colocarmos na ponta do lápis o valor dos produtos que produzem e o quanto que recebem, será que o valor é justo? Será que esses operários não produzem mais do que eles realmente recebem? Se isso acontece, pra onde vai essa margem de dinheiro que falta? É esse dinheiro que sustenta a família honesta do cidadão de bem? Será que esse humaníssimo patrão é considerado honesto apenas porque respeita as leis de mercado? Desde quando existem relações entre as leis de mercado e respeito ao próximo?
    Um publicitário, brilhantemente, convencer um indivíduo de que ele precisa comprar tal produto para ser uma pessoa bonita, é um ato nobre? Não é uma monstruosidade fazer pessoas acreditarem que comprando serão felizes, quando sabemos que isso não traz felicidade, apenas traz dinheiro para o mesmo que está pagando o publicitário pelo seu serviço? Não é uma monstruosidade, um ato desumano, deixarmos pessoas que não possuem meio de comprar um produto que ilusoriamente a deixará bonita, acreditar que elas são feias por não ter cabelos lisos, pele impecável e um tênis nike? Então quem tem dinheiro para comprar produtos é bonito e quem não tem dinheiro que de um jeito para ficar bonito/comprar ou se contente em ser feio? E quem compactua com isso, é o que? Homens e mulheres honestos, de bem, que nunca roubaram e nem mataram? Não fazer nada faz de você um ser humano digno?
    Longe de mim achar certo tirar a vida de outro ser humano, mas ao meu ver, isso que chamamos de crimes e monstruosidade, são muito mais humanos e primitivos do que essa robôtização e compra compulsiva de quem vive no mundo do faz de conta. Nos consideramos animais desenvolvidos e frequentemente nos perguntamos "o que nos faz mais evoluidos que outros animais", mas será que a pergunta não é outra? Será que a pergunta não pode ser "nós somos mais evoluidos que os outros animais?", Uma sociedade que acha bonito ensinar seus filhos que o importante é ser e não ter, mas na prática mostra que se você não tem faculdade, carro e roupas caras de nada adianta ser uma boa pessoa, uma sociedade que renega sua emoção, sua riqueza imaterial, seus sentimentos, principalmente o de amor ao próximo, não é mais desumana e monstruosa que os do primeiro parágrafo? Desses "homens de bem" eu gostaria ver o Datena e o Gil Gomes falarem um dia.