sexta-feira, 3 de junho de 2016

Privatização da universidade, o bonde que já passou.


   Todos que participam de debates sérios sobre educação frequentemente se deparam com termos como "sucateamento" e "precarização" tantos de escolas, quanto de licenciaturas. Nesses mesmos debates, provavelmente e inevitavelmente, esses debates cairão no temido assunto: privatizações

   Em âmbito estadual, vem se falando a tempos de propostas de cobrança de mensalidade nas três estaduais paulistas. Em âmbito federal, nas últimas semanas, esse debate vem esquentando, tendo o novo ministro da educação, Mendonça Filho (DEMO), se colocado a favor da cobrança de mensalidades em cursos de extensão e de pós-graduação. No início desse ano, o senador Marcelo Crivella (PRB) propôs um projeto de lei que cria mensalidade para estudantes das universidades federais. Alexandre Frota ainda não se manifestou sobre o tema.

   Essas movimentações acerva da privatização da educação não ocorrem por mera falta de informações dos que a propõe, não é ingenuidade. São reivindicações que fazem parte de um fenômeno maior. Essas reivindicações fazem parte das tentativas de implementação das políticas neoliberais. De maneira sucinta (mas nem por isso equivocada), o neoliberalismo são políticas que buscam entregar direitos básicos que são supostamente promovidos pelo estado às mãos de empresas privadas. Apegam-se em Adam Smith, na mão invisível do mercado que tudo regularia. Só não avisaram os trabalhadores onde essa mão invisível colocaria seus dedos. As políticas neoliberais ganham força na década de 70, com as ditaduras civil-militar brasileira e chilena, assim como é emblemático a ascensão de Margaret Thatcher como primeira-ministra do Reino Unido.

   Na universidade, o medo da privatização atinge aos três segmentos: funcionários, professores e alunos. O receio pela estabilidade no emprego, o anseio das cobranças pelos que podem vir a ser os patrões/grupos acionistas, a queda na qualidade do ensino, o medo das mensalidades que acarretarão na elitização escancarada do ensino superior.

   Dentro do cabo de guerra que é a "pretensão" de alguns em privatizar as universidades e nós, contrários à mercantilização do conhecimento e à elitização deste, muita coisa se passou e parece que o bonde da história também. Utilizei acima a palavra "pretensão" entre aspas, não por acaso. "Pretensão" de privatizar a universidade, pois talvez ela já tenha ocorrido.

   As faxineiras da universidade já são trabalhadoras terceirizadas. O xerox, terceirizado. Estudantes de Pedagogia almejando trabalhar em escolas privadas. Estudantes de Engenharia Ambiental saindo direto para instituições privadas. Estudantes de Educação Física pegando o diploma e indo direto para clínicas de personal e academias, todas privadas. O grande projeto dos estudantes de Física, produção de polímeros, altamente lucrativos para os empresários. Jonas Contiero, ex diretor do Instituto de Biociências da Unesp de Rio Claro, vetando da dissertação de mestrado de sua orientanda, conteúdos que são do interesse da empresa que financia suas pesquisas na universidade pública. Órgãos de fomento estatais -FAPESP- que investem apenas no que é rentável, ao que trará lucros.

   Chico Alencar (PSOL) diz que a cobrança de mensalidade nas pós-graduações e extensões representam o início da privatização do sistema público, e Edmilson Rodrigues (PSOL) afirmou que a proposta vai entregar patrimônio científico aos que se alimentam do lucro. Início da privatização? Vai entregar? Será que o bonde já passou e nós ainda estamos na fila pra comprar o bilhete?

   Caso a cobrança de mensalidades não se efetue, a privatização da universidade, a privatização do conhecimento público já ocorre à tempos! De fato, o estado-burguês e toda a sua prestação de serviços públicos servem essencialmente ao setor privado. O direito básico ao transporte, por exemplo. O que é ele se não o direito à levar os trabalhadores para seus postos de trabalho para que possam produzir e serem explorados tranquilamente? Dentro desse direito básico que é o transporte, o direito de ir e vir, quanto lucram as empresas com as licitações nebulosas que raramente possuem seus valores divulgados? Outro exemplo é a realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas no Brasil e a estreita proximidade com as empreiteiras. O conceito que nós temos de público, seu funcionamento, está intrinsecamente ligado ao setor privado, sempre um em detrimento do outro. E é por isso que a discussão entre mais estado ou menos estado é estéril.
 
    Talvez a privatização da universidade já tenha acontecido e nós não percebemos. Talvez ela tenha acontecido em partes e venha a se intensificar. Tanto uma, quanto outra, não é do agrado dos que acreditam que o conhecimento socialmente produzido, com o dinheiro da classe trabalhadora, deva voltar à ela. Esse conhecimento deve estar disponível para a classe que tudo produz, desde as cadeiras até as paredes da universidade. Se o bonde da história passou, a classe trabalhadora tem total capacidade e conhecimento para construir um bonde mais rápido e poder mudar o seu curso. Como disse Che Guevara, "que a universidade se pinte de povo!".