quinta-feira, 11 de junho de 2020

Escola, pandemia e luta de classes

A luta de classes é o motor da história. Um velho amigo me dizia que a história da humanidade é a história da luta de classes. Servos e senhores feudais, escravos e donos de terras, proletariados e patrões.

Nos dias de hoje a luta de classes é facilmente identificada nos serviços privados. Um exemplo claro disso são os trabalhadores de uma fábrica lutando por um salário maior, diminuindo a fatia do lucro do patrão. Essa é uma entre tantas outras formas em que se expressam a luta de classes. Mas ela não se limita às fábricas. Onde há trabalho, onde há trabalhadores, há luta de classes. A luta de classes está nas fábricas, mas também no futebol, na música, nas casas e também nas escolas.

A luta de classes está na escola em duas dimensões. Uma delas é a pedagógica.

É na escola pública que os filhos dos trabalhadores passam por anos de suas vidas. Por horas e horas, cinco dias na semana. Lá eles aprendem a narrativa dos que invadiram, estupraram e mataram como se fossem conquistadores. Aprendem a não aprender muita coisa, aprendem a obedecer e não questionar.

Essa dimensão se refere ao currículo, aos conteúdos, no trato com os alunos. É na especificidade do trabalho pedagógico. Quando ensinamos que o Brasil foi invadido e não descoberto, ao respeitarmos os pais que não vão a reunião de pais pois estão trabalhando, ao optar abordar os conteúdos sob a ótica dos explorados e oprimidos e não dos exploradores e opressores. Essa é a dimensão pedagógica da luta de classes.

Mas há uma outra dimensão da luta de classes na escola que não é específica dos professores. É a dimensão de trabalhador assalariado, a dimensão trabalhista, que é comum à todos outros trabalhadores. Esse trabalhador assalariado se depara com diversos problemas. Seu cotidiano é de baixos salários, salas superlotadas, falta de estrutura física, assédio moral. É lidar com superiores que defendem os ataques do Estado, seja em âmbito federal, estadual ou municipal. Superiores que passam pano para a retirada de direitos e abafam qualquer forma de resistência.

Os trabalhadores da Educação pública possuem condições precárias de trabalho ao mesmo tempo em que seus empregadores dão isenção de impostos para empresas, superfaturam contratos, fazem obras sem necessidade, apenas para benefício das empresas contratadas. Para as escolas a contingência, para os empresários a fartura.

No âmbito das escolas privadas a dimensão trabalhista da luta de classes na escola é mais escancarada. A busca de melhores condições de trabalho é assombrada pelo fantasma da demissão. Nas escolas privadas qualquer exigência por melhores salarios é em detrimento do lucro dos empresários da Educação. A mobilização aqui é um cabo de guerra contra a mais valia pedagógica.

Mas porque os professores insistem em considerar apenas a dimensão pedagógica e fingem não ver a dimensão trabalhista da luta de classes nas escolas? Quantos de nossos colegas de trabalho possuem posicionamentos político-pedagógicos progressistas mas se limitam a travar a luta de classes apenas na dimensão pedagógica?

Para esses professores do campo progressista ir a uma assembleia salarial, protestar contra o sindicato pelego, protestar contra a retirada de direitos ou ir aos atos de rua parece alucinação. Se limitam a trazer esses debates para a sala de aula enquanto os mesmos não se colocam em movimento. Debater os motivos disso não é o objetivo aqui, mas sim dizer que essa postura deve mudar.

Enquanto as mobilizações estão apenas no campo pedagógico, de qualificar o trabalho com os alunos, muitos professores continuam inertes. A tolerância ainda se mantém alta. Mas no c

ontexto da pandemia de Covid-19 essa realidade mudará, por uma questão de vida ou morte, e de classe.

Não se trata mais de exigir menos alunos por sala ou uma estrutura física adequada para poder ensinar melhor. Trata-se de fazer essas reivindicações para não nos contaminarmos. Em última instância, é melhorar as condições de trabalho para não morrermos. A demanda pedagógica vira uma demanda sanitária. O direito a aprendizagem se transforma em direito a vida!

Nesse contexto, muitos professores terão que descobrir que luta não se faz apenas em sala de aula. Luta não se faz apenas ensinando a luta que outros fizeram em outros tempos. A luta é necessária agora, nos colocando contra a volta as aulas e sabendo que isso é um enorme risco. É necessário sermos firmes e voltarmos para nossas atividades apenas se nos garantirem condições de trabalho que poupem nossas vidas, a vida de nossas famílias e a vida de nossos alunos.

Ter em mente essa dimensão do direito a vida é tão necessária quanto termos clareza da enganação que é o ensino a distância, onde professores fingem que ensinam e os alunos fingem que aprendem. O trabalho pedagógico se faz no tete-a-tete e com segurança.

A luta de classes, para além de sua dimensão pedagógica, se faz com nossos colegas de trabalho construindo coletivos e oposições sindicais denunciando os conchavos entre as direções picaretas e nossos empregadores que além de nossa força de trabalho e de nossa sanidade, no momento colocam em risco nossa vida.

Se os trabalhadores da escola ao serem contaminados ficarão a mercê dos serviços públicos superlotados, se não podemos fazer como os patrões que ao se contaminarem pegam seus jatinhos e se internam em leitos de hospitais particulares, que usemos nossa ferramenta histórica: a greve.

Enquanto não houver segurança e enquanto não houver qualidade não haverá aula!


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