sábado, 20 de junho de 2020

Futebol e luta de classes

A luta de classes é o motor da história. Um velho amigo me dizia que a história da humanidade é a história da luta de classes. Servos e senhores feudais, escravos e donos de terras, proletariados e patrões.

Nos dias de hoje a luta de classes é facilmente identificada nos serviços privados. Um exemplo claro disso são os trabalhadores de uma fábrica lutando por um salário maior, diminuindo a fatia do lucro do patrão. Essa é uma entre tantas outras formas em que se expressam a luta de classes.

Mas ela não se limita às fábricas. Onde há trabalho, onde há trabalhadores, há luta de classes. A luta de classes está nas fábricas, mas também nas escolas, na música, nas casas e também no futebol.

Por mais que babacas como Caio Ribeiro e Tiago Leifert digam que futebol e política não devam se misturar, essa relação não é uma escolha. Ela já está dada.

De que forma a luta de classes se apresenta no futebol? De diversas maneiras.

Uma delas é na concepção de que o futebol só deve ser assistido por quem pode pagar. Esse é o precesso de elitização dos estádios, onde é notável que os espectadores embranqueceram e se gourmetizaram. A população pobre foi excluída dos estádios por não poder pagar os caros ingressos. Não precisa ser nenhum gênio da sociologia pra saber que dentro desse debate tem a questão do racismo que inevitavelmente tornou os torcedores presente em sua grande maioria brancos. Esse é uma maneira em que se expressa a luta de classes no futebol. O direito a apreciar o esporte.

Há também uma forma mais clássica onde se expressa a luta de classes. Quanto ganham os roupeiros dos clubes? Quanto ganham as faxineiras? As cozinheiras? Os jardineiros? Ganham o mesmo tanto que os diretores ou que alguns célebres jogadores?

Assim como no teatro há o pessoal que trabalha no contrarregra, o futebol tem os seus. Aqueles que são fundamentais mas que não dão entrevistas depois do jogo. Sem eles não há uniformes, a grama não estaria cortada, o uniforme não estaria limpo, os jogadores não seriam transportados, etc. Esses trabalhadores são tão fundamentais quanto jogadores e dirigentes, mas recebem muito menos.

Quando Cristiano Ronaldo se transferiu para a Juventus de Turim por um valor astronômico de 447 milhões de reais, pago pela mesma família que é dona da Fiat e da Juventus, os trabalhadores da Fiat ameaçaram entrar em greve. Como os patrões daquela empresa teriam dinheiro pro Cristiano Ronaldo mas não para seus salários? Aqui a luta pelos salários não era de trabalhadores ligados ao futebol, mas sem dúvidas o lucro dos patrões desses empregados está relacionado ao esporte.

Quando em 2014 alguns movimentos da esquerda cantavam "não vai ter copa", questionando o valor absurdo gasto com os estádios, os despejos da população pobre e a farra das empreiteiras - que depois viria a tona, a direita e inclusive uma esquerda pelega davam risada. Nunca antes na história desse país os patrões da construção civil lucraram tanto. Lucraram com o suor dos trabalhadores, como sempre.

A luta de classes está também na disputa pela história do futebol. A posição de não assumir uma narrativa eurocêntrica que atribui toda existência do futebol brasileiro exclusivamente a Charles Muller é uma posição política. Assim como relembrar que seu passado é aristocrático e segregador, onde os pobres e negros não podiam jogar futebol nos clubes, pois os clubes eram só para ricos. Quando se esconder os fatos é habitual, a história se torna um campo de disputa.

Até mesmo nos campos de várzea ou futebol amador, esses que são praticados por trabalhadores nos finais de semana. Os campos de futebol são cada vez mais raros. A especulação imobiliária vê nesses campos a possibilidade de ganhar muito dinheiro construindo prédios. Para nós é a oportunidade de jogar, para eles é oportunidade de lucrar.

Luta de classes e futebol são tão ligados quanto o pé e a bola. Como em qualquer outro lugar em que a luta se expressa, é disputa, é conflito. Conflito inconciliável entre classes antagônicas, entre patrões e trabalhadores.

Negar isso já mostra o lado da trincheira que se ocupa. Do nosso lado da trincheira cabem torcedores de todos os times, todas as cores. Só não cabem reacionários.

Nem guerra entre torcidas, nem paz entre as classes!

Nenhum comentário:

Postar um comentário